data-filename="retriever" style="width: 100%;">O falecido colunista Paulo Santana, há muitos anos, escreveu a história de um homem que teve quatro casamentos com curta duração. Durante esse período, manteve uma relação clandestina com uma mesma mulher, a quem qualificava como "amante". Santana justificou a estabilidade da relação adulterina e a efemeridade dos matrimônios pelo fato de que, com as esposas, eram compartilhadas rotinas diárias boas e ruins, enquanto que, para a amante, eram reservados apenas os momentos de prazer e de alegria.
Nossa legislação refere-se a esse tipo de vínculo nominando-o de concubinato, definido como "relações não eventuais entre homem e mulher com impedimento para casar". Ele pode ser exemplificado pelos relacionamentos adulterinos ou incestuosos que não caracterizariam uma entidade familiar. Ainda assim, o concubinato pode produzir efeitos de ordem patrimonial, como na construção de um patrimônio com esforço comum, que acarreta na constituição de uma sociedade de fato.
Um grande dilema do direito das famílias é diferenciar a união estável, reconhecida como entidade familiar, do concubinato, quando uma das partes é casada ou vive paralelamente outra união estável. A lei traz como requisito para tal reconhecimento a separação de fato na primeira relação. Ocorre que os doutrinadores se dividem nesse entendimento, com argumentos de que o Estado não pode interferir na autonomia das pessoas na sua vida privada.
O Supremo Tribunal Federal (STF), recentemente, analisou tal situação em duas oportunidades.
O objeto específico das ações era o efeito previdenciário nas uniões paralelas. Por muito tempo, os tribunais vinham reconhecendo tais efeitos, desde que se caracterizasse a boa fé, isto é, se a parte integrante da segunda relação desconhecesse a simultaneidade da primeira família. Dessa forma, muitas pensões previdenciárias foram divididas reconhecendo a dupla relação de dependência.
A corte suprema reafirmou o dever da fidelidade e da monogamia no ordenamento jurídico brasileiro, aprovando uma tese de repercussão geral nesse sentido, determinando que uma pessoa, casada ou com união estável, não poderá ter, simultaneamente, reconhecido pelo Estado outro vínculo familiar, para fins de efeitos previdenciários.
Importante esclarecer que não houve unanimidade nessa decisão e, considerando-se o tema, o futuro poderá trazer outros desdobramentos, pois os fatos, em especial os que envolvem as relações mais íntimas, são absolutamente mutáveis e se antecipam ao regramento jurídico.
A orientação do STF provocará outros efeitos nas decisões sobre o tema, não se limitando à questão previdenciária. O que se deve relembrar é que, mesmo nos dias atuais, o adultério clandestino, como o exemplificado pelo falecido colunista, ainda é uma realidade presente, e, na sua maioria, tem a figura masculina como protagonista. Ocorre que a mulher, seja integrante de uma ou da outra relação, normalmente é vítima de uma situação de vulnerabilidade, reproduzindo-se assim uma cultura secular ainda presente.